domingo, maio 09, 2004

Uma mulher e tanto

Dia das mães é mesmo um dia especial.

A começar pela dificuldade de se encontrar uma mesa vazia em um restaurante.

É que no dias das mães ninguém quer sentir o desconforto de ser servido pela homenageada, como em todos os outros dias do ano.

Se estou passando a sensação de um protesto pelos outros 364 dias, convém esclarecer que não é esta a intenção. Até porque sou da velha geração, que leva a cerveja ou a taça de vinho para o marido na sala de televisão.

Não tive filhos homens, mas trato meu genro como se fosse meu filho e também para ele levo a bebida e o tira gosto sem que ele precise interromper o jogo para ir a cozinha.

Meu papel profissional não interfere em nada com o lado dona de casa.

Não importa em quantas cidades estive a trabalho, volto do aeroporto e vou direto para a cozinha preparar algum petisco que recompõem o sentimento de lar.

Tenho a sorte de pertencer ao grupo de pessoas que tem na mãe a inspiração e o modelo para seguir.
Aos 72 anos, minha mãe viajou sozinha em umas férias curtas para o Chile onde não conhece viv´alma.
Filha de familia pobre no interior de Goiás, D. Carmem passou a infância às margens do Paranaíba, em uma casinha de pau-a-pique.

Sem nenhum incentivo para isso, se afeiçoou aos livros, obtidos com dificuldade e lidos com a escassa luz de lamparina, sob as broncas do pai, preocupado com o consumo de querosene, coisa de luxo naquela época.

Aos 20 anos, seu primeiro parto foi de gêmeos, que morreram com menos de duas semanas de vida.
A próxima fui eu, doentinha e franzina. Nada parava no estômago da menina fragilzinha, sempre ameaçando ir seguir o mesmo caminho dos primogênitos. Apavorada, D. Carmem tentou de tudo para dar sobrevida ao seu bebê. A eficiência da alquimia utilizada me garantiu um estômago de ema, que tem na comida um fraco e tanto!

No total, oito filhos povoam a vida de D. Carmem, cada qual com sua série de filhos, garantindo à sua terceira idade (ai de quem falar em velhice) um séquito de convidados para os almoços de domingo.

Criatividade é com ela mesma. Precisa de uma nova televisão ou de uma nova mesa de almoço? Ao invés de pedir de presente, ela faz um almoço beneficente, e vende ingressos a preços de Fasano para interessados. Por que beneficente? Porque não é bonito "um almoço de arrecadação".

O coração grande não se contentou com os oito filhos. Em tempos muito difíceis adotou uma afilhada, que considera como filha e que morou conosco desde os quatro anos de idade.

Quando apresentei a ela meu candidato a marido, ela se afeiçoou por ele de imediato e o adotou também.

Passados quase trinta anos, posso afirmar com certeza que ela não o distingue de nenhum de seus filhos.

Preserva o amor pelos livros, que consome vorazmente, lendo uma média de três horas por dia, todos os dias. Ainda trabalha, de segunda a sábado, chefiando a produção de bolsas e sapatos finos. E ai de quem disser que ela deveria parar de trabalhar, ou de viajar.

É para essa mulher magnifica, um modelo e um exemplo para mim, que dedico esse dia.